JORNAIS VELHOS
No início dos anos 60 eu estava nos bastidores do Teatro Municipal do Rio de Janeiro pra receber uma menção honrosa pelo meu primeiro disco "AMOR DEMAIS" quando o Rubens Bassini, meu companheiro no Conjunto Ed Lincoln, me apresentou a uma cantora que havia dito a ele que era minha fã e queria muito me conhecer.
Eu fiquei lisonjeado porque já a conhecia pelo rádio e a admirava.
Ela me desarmou completamente quando me pediu um autógrafo.
Escrevi ( na capa da Revista do Rádio ) o que, sinceramente, sentia: "Para a Elis Regina o abraço do seu admirador Silvio Cesar".
Algum tempo depois, fui convidado a fazer uma temporada na boate Djalmas, em São Paulo e sugeri ao diretor do show - Roberto Jorge convidarmos a Elis.
Falei com ela e ela aceitou dividir comigo o palco e a " grana " .
O Eumir Deodato escreveu as cifras das músicas pra nós e partimos.
Ficamos hospedados num apartamento na rua Albuquerque Lins, que estava vazio e pertencia ao diretor de cinema Aurélio Teixeira - casado com a mãe do Roberto, a grande atriz Gracinda Freire.
A Elis levou com ela uma menina para cuidar do apartamento e de nós.
A banda que tocou conosco era formada pelo pianista Luis Melo, o baixista Xu Viana, o baterista Turquinho, o trompetista Kuntz e o Hector Costita, no sax
Uma super banda.
O show, musicalmente, saiu como queríamos.
A crítica elogiou, os jornais deram cobertura, com fotos quase diárias.
O jornalista Arley Pereira tinha a gravação do show, mas ela, misteriosamente, sumiu.
Infelizmente, como sempre acontece com cantores iniciantes, o público não compareceu como esperávamos.
Certa noite apareceu na boate um jovem cantor que estava lançando um samba diferente, com um gestual característico e uma letra meio que falada:
"deixa que diga, que pense, que fale, deixe isso pra lá, vem pra cá o que é que tem?..."
Reconheceram?
Pois é. Vejam o que é o destino!
O Jair Rodrigues jamais imaginaria, naquele momento, que um dia iria formar com a Elis uma das duplas de maior sucesso na televisão, como aconteceu, mais tarde, com o "O fino da Bossa", na TV Record de São Paulo.
Voltando à história:
O Solano Ribeiro dirigia um show no Teatro de Arena e nos convidou a cantar lá uma noite, como convidados.
Nós fomos e entre outras músicas, cantamos, à capella, "O amor em paz",
do Tom e do Vinicius.
O Solano ficou encantado e convidou a Elis para cantar no Festival da Canção, na TV Record, do qual ele era o diretor.
Quando a nossa temporada terminou, surgiu o convite para trazer o show para o Bottles Bar, no Beco das Garrafas, no Rio.
Eu não pude aceitar porque tinha outros compromissos.
A Elis faria o show sem mim, numa boa.
Quando estávamos arrumando nossa bagagem para voltar, demos falta dos recortes das matérias que saíram nos jornais.
A menina havia rasgado e jogado fora aquele "monte de jornais velhos".
Ficamos desapontados, mas não brigamos com ela, que havia cuidado de nós tão bem e com tanto carinho.
Voltamos ao Rio, a Elis fez o show e, como não poderia deixar de ser, " arrasou ".
Eu participei indiretamente, compondo especialmente para o encerramento do espetáculo, o samba " Copacabana ".
Depois, ela foi a São Paulo, venceu o Festival da Canção com a música "Arrastão", do Edu Lobo e do Vinicius de Morais, assinou com o Marcos Lázaro, o maior empresário de artistas do país e foi contratada pela TV Record para apresentar o programa " O Fino da Bossa " .
Daí pra frente foi um furacão de talento que invadiu o Brasil e, não fosse a fatalidade, certamente invadiria o mundo.
Hoje, olhando pra trás, depois de acompanhar por tantos anos ( de dentro e de fora )
a trajetória da nossa música, eu penso:
Se a " baixinha " ainda estivesse entre nós, a história da Música Brasileira seria outra.